Símbolos da segurança, da força e da disciplina, os policiais militares também são vítimas de dramas e pressões sociais como os civis. A exposição à violência, a falta de reconhecimento, o estresse e a rigidez hierárquica, associados a questões da vida particular, estão produzindo números alarmantes: os servidores da Brigada Militar, sobretudo os praças, são os que mais cometem suicídio em comparação com as polícias dos maiores Estados brasileiros.
Entre 2015 e 2018, 17 brigadianos da ativa tiraram a própria vida no Estado, conforme dados obtidos pela Lei de Acesso à Informação. Considerando o efetivo da corporação, os brigadianos gaúchos atingiram a média de 30,7 suicídios a cada 100 mil habitantes, ante patamares de 20,9 em Minas Gerais, 20 em São Paulo, 16 na Bahia e 9,1 no Rio de Janeiro.
O Rio Grande do Sul é o Estado com o maior índice de suicídio entre a população brasileira em geral, com 10,3 casos a cada 100 mil habitantes, conforme dados do Ministério da Saúde. Um estudo canadense — Suicidality Among Police — estabeleceu a média de que episódios de mortes autoinfligidas para cada 100 mil é de 18,2 levando em consideração as polícias de todo o mundo. Ou seja, a taxa de casos entre policiais militares gaúchos supera as ocorrências entre civis e outras forças de segurança.
— Sabe-se que existe mais suicídio entre policiais, seja aqui no Brasil ou fora. Sem dúvida, existem fatores que pressionam esse profissional. O estresse das ocorrências, a forma como a sociedade vai vê-lo, a ideia de que não se pode errar que existe no meio militar. Muitas vezes, o policial é hostilizado. A falta de reconhecimento da sociedade causa estresse — diz a major Denise Gomes, coordenadora da seção biopsicossocial da Brigada Militar, especializada em atender agentes com problemas psicológicos ou ideação suicida.
O fato de policiais de menor renda viverem em locais conflagrados, onde são vistos como inimigos, também já foi revelado em sessões de terapia como fator de pressão extra. A rigidez hierárquica surge nos relatos, com eventuais abusos de superiores sobre soldados. A morte de colegas de trabalho em operações é apontada como causa de estresse pós-traumático.
“Quanto maior a incidência de crimes violentos, registrados nas áreas de atuação do batalhão, maior será a vulnerabilidade de policiais militares às violências autoprovocadas”, diz trecho do livro Por que policiais se matam, organizado por Dayse Miranda, uma das referência do assunto no Brasil.
Para lidar com o problema, o governo estadual preparou série de atividades no Setembro Amarelo, mês marcado pelas ações de prevenção ao suicídio. Uma das principais atividades ocorrerá em 1º de outubro, em Porto Alegre, com a realização de seminário internacional sobre prevenção ao suicídio na segurança pública. O evento terá como palestrantes o capitão Diógenes Martins Munhoz, do Corpo de Bombeiros de São Paulo, e a psicóloga argentina Alicia Galfaso. Ele falará sobre protocolos de ação para PMs que atendem ocorrências de suicídios de civis, enquanto a mulher irá abordar a saúde mental do policial e os riscos associados ao sofrimento psicológico.
— O evento é para que os policiais possam ouvir de especialistas que eles precisam se cuidar. Policiais têm grande risco de adoecimento e é necessário falar sobre isso — diz Andréia Volkmer, coordenadora do Comitê de Promoção da Vida e Prevenção do Suicídio, órgão do governo do Estado criado em 2016.
— Admitir alguma fragilidade, por parte do policial, é difícil. Enquanto a sociedade foge do perigo, o brigadiano vai ao encontro dele. Nosso trabalho é sensibilizar para que o policial procure ajuda e não deixe a doença se estabelecer. Falar ajuda a prevenir — frisa a major Denise.